Educação é antes de tudo arte!
Arte de sentir, arte de ser, arte de conhecer... É ser curioso, é não aceitar a simples resposta: porque é assim!
Educação é mais do que ser cortês, é desejar alterar as fronteiras do conhecido para adentrar o desconhecido, é humanizar-se, é evoluir em atitudes e comportamentos.
Educar-se é estar constantemente trilhando o caminho do desenvolvimento, e esse caminho não é solitário, é conjunto!

Vamos juntos trilhá-lo!


terça-feira, 6 de julho de 2004

A arte da História na Educação Patrimonial

“Um olhar sobre o velar e o desvelar, a figura destacada e a figura escondida, o ritual de passagem do conhecido para o desconhecido, nos inquieta. A Arte não responde. Pergunta.”  (Inventário dos Achados: o ohar do professor – escavador de sentidos. 4ª Bienal do Mercosul – Ação Educativa – 2003 – p. 5)

Este artigo é uma tentativa de entrelaçar um período de estágio na disciplina de Prática de Ensino com a proposta de desenvolvimento de uma experência com o trabalho de Educação Patrimonial. Neste sentido foi que escolhi a epígrafe sobre o “velar e o desvelar”, sobre a “figura destacada e a figura escondida”, sobre a “passagem do conhecido ao desconhecido”, enfim, sobre o que há de relação entre o ensino de história, a Educação patrimonial e a Arte. Comecemos pelo fim para retornar ao início. Pela resposta para chegar à pergunta: a Arte está entendida aqui como expressão cultural, como produção do seu tempo, do seu espaço, introduzido e produzido por um meio social e cultural delimitado. Entretanto, neste artigo também estamos considerando Arte como o enlevo do saber, a estética do conhecer, o sentimento de curiosidade que envolve aquele que pergunta, aquele que produz história. Se a Arte (aquela que consideramos em aspectos físicos) não responde, pergunta, a Arte de sentir a história também não nos dá a sensação do completo saber, pelo contrário, nos diz que quanto mais procuramos as respostas, mais perguntas encontramos.

Se pudermos transpassar o limbo existente entre essa Arte abstrata da curiosidade do saber e do documento histórico, estaremos contribuindo para o que Luporini escreve sobre a tendência em relação ao crescimento da consciência sobre o patrimônio”(2002:325), que indica a ampliação do termo patrimônio histórico para patrimônio cultural e também a ampliação da noção de bens culturais, considerando a apropriação do conhecimento via indústria cultural.

Mas afinal, que relação há entre Arte e História? Digamos que, em tese, a História está para a Arte assim como a abelha para o mel, ou seja, a abelha vive para produzir o mel e produz o mel para viver. Tal qual a História, que pela atuação de seus agentes, produz a Arte, assim como a Arte produzida sustenta a própria História.

Dessa forma, começaremos a compreender o papel do professor diante da Educação Patrimonial (histórica e cultural) como um “escavador de sentidos”¹ . É justamente neste momento que acontece aquela inquietação já referida. Inquietação levantada no momento em que a aula de história ultrapassa os limites físicos da sala de aula e chega até a uma instituição cultural, como o Museu Joaquim josé Felizardo (Museu de Porto Alegre), a uma instituição de Patrimônio Histórico como o Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, ou ainda num acervo privado de documentações diversas como a referente ao orçamento participativo, abrigado pelo Programa de pós Graduação de Educação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Isso porque é nesse instante que se começa o “ritual de passagem do conhecido para o desconhecido”. Porque o olhar escavador de sentidos é um

“olhar mais profundo e ao mesmo tempo sem pressa, ultrapassando o reconhecimento, o fim utilitário das imagens, e que se torna um leitor de signos. Nesse movimento do olhar, segundo o filósofo francês Georges Didi-Huberman, não só olhamos a obra como ela também nos olha. Atento aos sentidos das imagens, tal qual um arqueólogo que escava à procura do desconhecido, o professor-pesquisador é um leitor de imagens que elege aquelas que vão adentrar na sala de aula para o deleite e investigação dos alunos.” (Inventário dos achados: o olhar do professor – escavador de sentidos. 4ª Bienal do Mercosul – Ação Educativa – 2003:8)

Portanto, o professor é a chave, o elo de ligação, é o responsável pelo desvelar da História a partir da Arte envolvida na Educação Patrimonial ou a partir da sala de aula, com as “figuras destacadas”, para chegar à Educação Patrimonial com as “figuras escondidas”.

Este é exatamente o ponrto chave para introduzirmos o trabalho de monitoria realizado no Museu de Porto Alegre, que, a partir de objetos, tenta recontar a história de Porto Alegre.

Monitor, professor, mediador.

No museu chama-se de monitor aquele professor que faz a mediação entre os saberes daqueles que visitam o acervo e os próprios objetos constituintes do acervo. É aquele capaz de alterar as fronteiras entre o que é conhecido e o que ainda é desconhecido.

“Nesse trabalho gerador de sentidos e significação, o professor é um perguntador, é aquele que sabe perguntar e levar o olhar a dialogar com a imagem, aguçando a curiosidade e o desejo de olhar o que ainda não foi olhado”. (Inventário dos Achados: o olhar do professor – escavador de sentidos. 4ª Bienal do Mercosul – Ação Educativa – 2003:9)

Compreendemos, portanto, este professor como um orientador do olhar através da pergunta, o olhar estético sobre a História, a Arte da e na produção do conhecimento. Entendemos que o Museu e seus objetos não são as respostas sobre qual foi a História de Porto Alegre, mas exatamente ao contrário, eles são os geradores de perguntas sobre essa mesma História. E por isso é que a Arte não responde, pergunta.

Ao sairmos do Museu, o professor passeia pelo Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul (AHRS) com seus alunos através do estágio realizado. Qual sentido daremos ao trabalho de Prática de Ensino a partir da catalogação de um acervo particular composto de reportagens coladas em grandes livros, sem ordem aparente?

O sentido surge no momento em que o professor trabalha com os alunos o tema MEMÓRIA. A imprensa surge como fonte histórica, portanto, espaço da preservação da memória. Entretanto, quando se trabalha com este tipo de fonte é preciso ter alguns cuidados, pois

“a notícia não vale por si mesma como fonte de informação, é necessário proceder à análise crítica da mensagem que veicula, tendo-se em mente que a imprensa age no campo político-ideológico e, por isso, deve-se estabelecer as principais características de periódico consultado.” (LUPORINI, 2002:329)

Entra em ação o professor que faz a mediação entre o aluno e o documento, delimitando a imprensa como fonte documental histórica, mas não necessariamente como expressão da verdade. Neste exercício de mediação, aquele que teve a oportunidade de conhecer um processo de catalogação de um acervo como o de Hamilton Moojen, no AHRS, pode empreender, com seus alunos, um projeto de pesquisa sobre determinado tema ou período em fonte jornalística impressa para exemplificar o processo de preservação da memória, a partir da Educação Patrimonial, com a constituição de um acervo montado pelos próprios alunos. Este seria um exemplo de processo pedagógico para o trabalho de preservação da memória e Educação Patrimonial.

Ainda sobre a imprensa, nos debruçamos com o terceiro espaço de estágio: a documentação de clipagem do Orçamento Participativo. Embora o trabalho do estágio, neste caso, tenha sido parecido com o do AHRS, uma outra perspectiva de relação se abre ao considerarmos as Assembléias do Orçamento Participativo como um Devir na história da participação popular nas decisões administrativas-financeiras de políticas estaduais, até então legadas somente ao Estado.

Voltemos neste momento à pergunta inicial ainda não apresentada. Podemos compreender como Arte o produto do nosso estágio? Podemos compreender os arquivos do OP, organizados por ordem cronológica, o acervo Hamilton Moojen e as monitorias do Museu como Arte?

Se considerarmos o trabalho estético do trabalho manual do numerar páginas de um acervo e do trabalho intelectualdo mediador que altera as fronteiras do conhecido e do desconhecido, reconheceremos, em ambos os casos, o espaço da Arte na construção do conhecimento. Não a Arte palpável de uma escultura, mas a Arte do sentimento, aquela que deve brotar no ser curioso que indaga ao professor o sentido das coisas que vê ou o sentido das coisas que não consegue ver.

Portanto, no estágio (em três estágios) realizado, percebeu-se que quando o prazer de sentir a Arte da História supera a necessidade de contar a História é que podemos realmente falar de Ensino de História voltado para a Educação Patrimonial.

¹ Termo utilizado no livro 4ª Bienal do Mercosul (2003) para definir o olhar da Curadoria da Bienal para a seleção das imagens.

Referências Bibliográficas:
4ª Bienal do Mercosul Ação Educativa: Inventário dos Achados, o olhar do Professor Escavador de Sentidos. Porto Alegre, 2003.
VIGNOL, Ana Letícia de Alencastro. In PADRÓS, Enrique Serra. Ensino de História: formação de professores e cotidiano escolar. Porto Alegre: edições EST, 2002; p.231-239.
LUPORINI, teresa Jussara. Educação Patrimonial: projetos para a educação básica. Ciênc.Let. Porto Alegre, n 31, p. 325-338, jan/jun,2002.